No pátio da minha escola, uma escola pequena e rural podo escuitar
grande variedade de línguas e sotaques: galego ocidental, castelhano
argentino, galego da montanha, árabe, castelhano estremeiro,
portugués, chinés, castelhano caribenho, romeno, galego do sul,
catalão, castelhano da Galiza… mas é também habitual sermos
surdas a essa variedade, e ignorá-la.
A nossa vida não deixa de ser uma sucessão de aprendizagens. Desde
que nascemos não fazemos outra cousa. Aprender aprender aprender.
Porém, algumas, botamos meia vida a dessaprender, que é uma
atividade muito mais interessante e profunda. Disto sabemos muito as
feministas. Grande parte da nossa atenção está focada a revisar os
hábitos e atitudes interiorizados desde crianças e deitá-los fora
de nós. Como querer(nos), como cuidar(nos), que estudar, onde a
dignidade, onde as cousas que pagam a pena, como sermos nosoutras.
Algo semelhante deveríamos fazer as linguistas. São tantas as
aprendizagens falsas, mal orientadas, descarreiradas que fazemos
desde a escola primária, que mesmo é importante pararmo-nos e fazer
uma revisão dessaprendedora da nossa ideia de língua, de variedade,
de importância, de necessidades de conhecimentos.
Isto nos dessensina Teresa Moure no seu Linguística eco- . O
estudo das línguas no Antropoceno. O livro é um renovo. Já a
autora se achegara ao tema num opúsculo anterior, Ecolingüística:
entre a ciencia e a ética1 .
A estrutura elegida é a mesma, porém amplia os conteúdos e afunda
mais nas relações entre pensamento ecologista e linguística(s).
A proposta é bem singela: todo quanto aprendemos,
filólogas, mestras, professoras de línguas, não é outra cousa que
uma sucessão de preconceitos que, por não questionarmos, por não
repensar, contribuímos, desde as nossas profissões, a manter e
expandir.
Assim, Teresa Moure analisa os estudos de linguística e as suas
verdades oficiais acolhendo-se a uma perspetiva ecológica, numa
combinação que privilegia a diversidade de focos de onde revisar a
disciplina e, essencial, acompanhando-se sempre da ética. Se algo
aprendemos no processo de leitura desta obra é que tal como não há
estética sem ética, não pode haver ciência sem ética. Se algo
fica claro acabado o livro é que não acreditamos existirem línguas
melhores e línguas piores, línguas para o progresso e línguas para
o atraso porque sim, mas porque o aprendemos de quem nos deveria
liberar de tais preconceitos: a intelectualidade linguística. Porque
a principal utilidade das línguas é serem instrumentos de poder e
domínio. E aqueles que as ensinam ocultam sempre este potencial uso
das mesmas. Para nós não perceber. E pretendem fazer-nos ver como
naturais, lógicos, neutrais, asséticos e científicos processos que
só são possíveis desde a violência contra as pessoas e as
comunidades.
A obra, de carácter didático e divulgador, acompanha-se de pequenos
exercícios para refletirmos sobre os conceitos tratados em cada
capítulo: quantas línguas não europeias és quem de citar? Há
vocábulos intraduzíveis? Conheces o Luisenho? Quantos nomes de
ervas conheces na tua língua? Fazer as tarefas ao tempo que seguimos
a leitura vira incomodidade. A autora tem a capacidade de colocar,
naipes boca acima, as falsas ideias, o grande desconhecimento que
acumulamos. E sempre é a incomodidade necessária para visualizar a
mudança em nós.
São muitos os sub-temas que trata Teresa Moure. Desde o próprio
conceito de Linguística até as línguas menorizadas e as
estratégias de luita e resistência para as manter vivas. Do
conceito de variedade à limitação dos estudos de campo. Da língua
e as mulheres até a perda da riqueza léxica.
A verdade é que é esta é uma obra que devera de ser de leitura
obrigada nas escolas e liceus galegos. E não, não polo alunado dos
centros, mas por todo o seu professorado. Aquele de departamentos
linguísticos em primeiro lugar, é claro, mas em realidade todo em
conjunto. Não deixamos de ter a língua como instrumento de trabalho
e transmissão de conhecimentos e quiçá é básico sabermos
utilizar esse utensílio sem cairmos no abuso de poder. E sem cairmos
no fortalecimento inconsciente de preconceitos que condenam à nossa
língua, a galega, ao desaparecimento.
Temos que ser quem de sair aos pátios das nossas escola e atender
aos diferentes sotaques e falares e sorrir orgulhosas da diversidade
que gozamos. E defendê-la. Rotundas.
Teresa Moure: Linguística Eco-. O estudo das línguas no
Antropoceno.
Através Editora 2019
1
Universidade da Coruña, 2011.
(Re)Aprendermos a falar, por Susana S. Aríns
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09:16:00
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