Mulheres que fazem sorrir por Susana S. Arins

Fotografía Paula Gómez del Valle

É lindo ler em trajetória… avançar com a autora e acompanhá-la na sua evolução como escritora, na construção do seu estilo, na depuração dos seus interesses, na profundização das suas personagens, na cimentação da sua voz.
E isto é o que sentim ao ler o volume de relatos de Margaret Drabble. Seique são os relatos completos numa edição preciosista (como tantas) de Impedimenta. Isto é importante, porque é a causa desta autora entrar na minha vida: um título sugestivo, uma capa atraente, uma contracapa sedutora e zás, servidora que paga o prezo e leva para a casa. E como tantas vezes, lemos na lapela os biodados da autora e não percebemos como chegam a nós tantos senhores desinteressantes e tardamos anos (uma já vai numa idade) em aceder a autoras com semelhante trajetória. Quer dizer, uma nova prova de que ninguém fala de nosoutras nisso da globalização e o imperialismo cultural anglosaxão.
O caso é que enredei nos contos. Quase todos protagonizados por mulheres. Co-protagonizados. Extranhas num comboio, ex-amantes de reencontro casual, casal em viagem de noivado, amantes em incógnita viagem … e sempre combinando, aí a atração, o ponto de vista da mulher protagonista os eventos de cada conto. Todas as suas mulheres vivem imersas nas suas fantasias e pensamentos, que muitas vezes contrastam, deformam, ironizam, a realidade exterior que nos mostra a narradora. Ao início. Porque, numa subtil e permanente mudança, lemos como passam a ser as protagonistas absolutas de cada conto, para rebordar nos últimos do volume, os mais recentes da autora, com as suas vozes rotundas e magnetizadoras. Já essas fantasias e pensamentos invadem a trama para ocupá-la por inteiro e, assim o percebemos, focar o interesse da Margaret Drabble no momento de construir o texto.
Marca o giro, quiçás, o conto que dá título ao volume: Un dia en la vida de la mujer sonriente. Havia uma vez uma mulher, começa. E acedemos aos quartos ocultos por trás do sorriso duma jornalista televisiva de grande sucesso. A partir de aí sempre acontece assim: nas primeiras linhas sabemos duma mulher, Elsa, Elisabeth, Hanna Elsevir, Mary Mogg. Todas elas diferentes, todas elas de verdade (têm a regra, estão fartas de cuidar pessoas, mimam de mais as suas crianças, suportam humilhações maritais) e todas elas rompendo com os ténues cabos que as ligam à vida normal, ao adequado, ao esperável numa viúva, numa famosa atriz, numa prémio nóbel, numa professora.
Adorei, sobre todas as cousas, a subtileza com que são narradas e expostas as opressoras vidas matrimoniais, a invisiblidade do maltrato psicológico, a imperceptível, portas afora, violencia machista, a pressão para serem as mulheres que devem ser. Nisto é exemplar e marabilhoso o conto da viúva alegre. Literalmente assim. Feliz de sentir-se livre. Gozando por fim duma afição tão inofensiva como desprezada polo defunto homem: identificar classe e espécie das flores silvestres.
E os finais sem final. Deixar-nos assim, não na dúvida, mais com a oportunidade de fecharmos nós a história. Ou com a certeza de que há histórias que não devem de ter final. Assim? Já? Perguntavamo-nos nos primeiros contos. Assim. Já. Afirmamos, entanto sorrimos, nos últimos.
Porque aprendemos.

Margaret Drabble: Un día en la vida de una mujer sonriente. Relatos completos.
Tradução de Miguel Ros González. Impedimenta 2017.

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