Ao aghinaldo imos ao ghinaldo andamos. Por Susana Sánchez Aríns

Susana Sánchez Aríns no I Día das Galegas nas Letras

Por Susana Sánchez Aríns

Los pajarillos cantaban     celebraban noche y día
cada uno con sus cantos   viva José y María
La sagrada reina y salve    y su esposo san José
encinta de nueve meses    cogieron camino a pie
es preciso dueño mío        buscar posada con tiempo
que se va aproximando     la hora del nacimiento
Allá por la media noche    parió la virgen María
tanta era la pobreza          que un pañuelo no tenía
bajó un ángel del cielo      ricos pañales traía
unos eran de holanda       otros de holanda fina
otros de seda bordada     donde cristo se envolvía

No Fojo, a minha aldeia, ninguém sabia dançar, cantar nem tocar (o da música completa era para outros lugares). Quando as rapazinhas do grupo Abrente botavamos uma moinheira, ninguém saía ao campo a acompanhar-nos na baila. Quando a minha irmã Irene ensaiava com a pandeireta, nenguma vizinha assomava por cima do valo para corrigir-lhe as punhadas ou as coplas. E quando Pablo andava a voltas com os ponteados da gaita, ninguém acodia dizendo essa sei-na eu. Porque no Fojo ninguém sabia cantar nem tocar.

Foi uma enorme surpresa quando, uma tarde de novembro ou dezembro, não lembro, Pablo veu buscar-nos à casa. Combinara no teleclu com Virucha e Carmem da Quenlha. O teleclu do Fojo era uma casinha com paredes de papel que naqueles tempos malarranjaramos para ter como local próprio e juvenil. Ensaiavam vários grupos musicais e a estética do espaço era do tipo casa okupada: móveis resgatados dos faiados e das palheiras, asseio básico, cartões de ovos nas paredes e cheiro a tabaco. Para as línguas marmuradoras, espaço de vício e perdição. Por isso, que Virucha e Carmem foram ao teleclu era uma surpresa. E mais surpresa foi saber a razão: iam aprender-nos uns cantos de reis.
Se no Fojo ninguém sabia cantar...

Carmen nasceu em 1920, agora anda nos 94, e lembra quando em 1926, ponhendo as patacas na casa de Ventosela, passou um zepelim por cima da sua cabeça. Quando nos cantou os reis andava nos 80 (é pois, falo-vos do ano 2000) e não fazia mais que porfiar com Virucha sobre as palavras dos versos ou a tonada das coplas. Carmen sempre gostou da gente moça e não se me fazia estranha entre nós, mas Virucha... Era a nossa vizinha de em fronte de toda a vida, não a lembro a sorrir ou fazer um carinho nunca, e vê-la ali sentada, naquele sofá de escai, aceitando o convite a café, semelhava bricandeira. Virucha teria hoje 81 anos, é dizer, era muito mais nova que Carmen, de aí os trasacordos. Uma dizia que fora mais anos a cantar os reices e que sabia melhor as letras; a outra retrucava que era mais nova e tinha melhor memória... mas forom cantando. Virucha contavanos que ela participara nas últimas saídas a cantar. Depois dela já ninguém pedira aguinaldos.

E aprendemos três cantos, que nomeamos Caminito, Los pajarillos e Casinha Nova. Como Pablo estudava músicas várias, preparou as partituras, ensaiou com o acordeão e pugemos dia para ensaiar. E como aquilo era um acontecimento (lembrade que no Fojo ninguém sabe cantar, bailar nem tocar) decidimos gravar os temas. Daquela não tinha todo o mundo portátil, assim que tomamos de maneira furtiva o computador de mesa a meu pãe, no que instalaramos um programa de edição de som, e levamolo numa carretilha para o teleclu. Todo pola cultura!

E assim, o 24 de dezembro de 2000, juntamo-nos para gravar, cantar e tocar (dançar já era muito) Pablo Bernardo, Natália de Pernaviva, Xermán de Couso, Manuel de Otero e os Arines todos, Irene, Carmela, Xurxo, Inhaqui e esta que escreve; andavam de espectadores os meninhos da aldeia, Manuel e Bárbara de Ferrim.

A gravação foi divertida (ainda existe o CD que o corrobora) porém o melhor foi a festa. Porque o 5 de janeiro de 2001 lá nos juntamos todas para cantarmos os reis polas casas do Fojo e polas da volta. Começamos na de Virucha, que não dava creto ao que escuitava e via: gente moça celebrando os reis passados mais de 50 anos. Não se animou a acompanhar-nos, mas sim Carmem, que foi a segunda a quem lhe pedimos o aguinaldo, castanhas, chouriços, fabas e torresmos. E assim como para nós foram inesperadas cantadoras Carmem e Virucha, nas casas do lugar foi grande a surpresa do chamado noturno. Nalguma acirraram os cães pensando-nos ladras (também o faziam quando corriamos o entroido). Em muitas abriam as portas amedonhadas para depois convidar a passar, e lamentavam não saber da visita para ter preparado um biscoito, uma rosca, o aguinaldo. Porque em todas as cozinhas, de súbito, emergia a memória daquelas noites de reices arrombadas em faiados e palheiras, como os móveis do teleclu, para serem substituidas por programação televisiva especial.

Para nós cantaram Carmem e Virucha, mais antes o figeram, em fevereiro de 1981, para Dorothé Schubarth, Cecilia, de 71 anos e outra Carme, de 67. Eram do lugar de Fontenlo, em
Codeseda, e cantarom o Caminito, tal qual o aprendemos nós. Também o cantou em Calhobre e fragmentado, Mercedes, que em 1979 tinha 79 anos, é dizer, era vinte anos mais nova que Carmem da Quenlha. E no Cancioneiro de Dorothé aprendo que o nosso Caminito não é outra cousa que um canto sobre um dos temas do ciclo natalício, a fugida a Egito da Virgem, José e o Meninho, e dentro deste, o encontro com o cego. A que nós chamavamos Los pajarillos é uma versão, que não encontro literal no Cancioneiro, do nascimento de Jesús. Parece-me diferente das que recolheu Dorothé porque variam as assonâncias.

Porém aparecem parte dos pareados enjertados naqueles que cantaram Sergio, Chola e Rosa, em Abuime, o Savinhau, no ano de 1980, ou dos que lhe botaram no Entrimo, na outra ponta da Galiza, em 1983, Julia, Cholos e Rosa. E a que nós chamabamos Casinha Nova são dous cantos diferentes junguidos pola melodia: um canto sobre o tema do meninho perdido, que cantamos quase como o fez em Toques Ramona, que tinha 79 anos em janeiro de 1980; e uma despedida do aguinaldo semelhante à que cantou Maruxa em Moinhos, nas terras de Bande, em 1981.

No lugar do Fojo, no ano 2000, alguém aprendeu a cantar e tocar. É certo, ninguém sabia de Dorothé Schubarth, porém, sem saber dela, no fundo, sabiamos.

Como mudou a nossa imagem de Virucha e Carmem após aquele Natal. E penso que elas olhavam para nós e o nosso teleclu, duma outra maneira. E desde aquela tarde em que aprendemos que no Fojo havia quem sabia cantar e tocar outro pensamento começou a percutir no coiro da minha cabeça: que tanto dano fez o franquismo na alegria...

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O meu nome é Susana Sánchez Arins. nasci no ano 74. levada por uma quase doentia propensão leitora, figem estudos de filologias, o que me permitiu achegar-me a um manado enorme de literaturas, livros e escritoras. ponho escola no ensino secundário. publicarom-me três livros de poesia e um manado de recensões literárias n'A Sega. as terças, de 18.30 a 20.00, vou a aulas de pandeireta.


Comentarios

  1. Revivendo tempos e pessoas através das antigas canções!

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