Wislawa Szymborska: não há livro pequeno

Marcio Ramalho

Por Susana Sánchez Aríns

Quando uma pessoa che propõe leituras não obrigadas está a dizê-lo todo. Está a dizer que não che considerará uma pessoa merecente do desdém mais absoluto se não as les (há críticas assim), e que não passa nada se vives sem conhecê-las. Está a dizer-che que ela leu-nas muitas vezes sem causa aparente, porque sim, sem fim utilitária. Que a vida existe fora desses livros e que se não conheces Tácito ou o Abencerraje y la hermosa Jarifa não passa nada.

Mas quando essa pessoa é Wislawa Szymborska o primeiro que fas é entrar no livro disposta a ler todo quanto recomende e a desprezar todo quanto ela desprece. Pensas na ôsmose como uma possibilidade científica e possível de aprendizagem: se leio o que ela lê, igual se me pega algo da sua qualidade poética. Ademais, pensas que quiçás assim conheças um pouco a(s) literatura(s) eslava(s), ti tão hegemonicamente românico-germânica. Porque o que aguardas dela é que recomende grandes obras literárias, merecentes de ser canonizadas. Gentes como Czechowicz, Mickiewicz, Słonomski ou Twardzik.

E zás! Labaçada pedagógica!

Há uma máxima futboleira a assegurar que não há equipa pequena. O mesmo opina Wislawa Szymborka dos livros. A autora não despreza nada. Nem sequer aquilo que merece ser desprezado. Comenta leituras de toda caste e lugar sem reparar em se é próprio duma grande intelectual polonesa falar delas. Porque ela não escolhe o rol de grande intelectual polonesa, mas o de leitora entusiasta. Transparenta-se como uma pessoa curiosa, que todo o quer saber do mundo em que vivemos, e que tanto aprende da história do papel na antiguidade como dos epigramas de Marcial como das instruções para construir uma boa pérgula: coube na sua coluna literária o libro guinness dos records, a Astrea, a cozinha do afastado oriente, as biografias de grandes artistas, as obras de divulgação científica, as de bricolagem e mesmo livros de poesia.

O que nos aprende é que de todo podemos sacar partido: quando uma leitura a emociona, a atrapa, a cativa, emociona-nos, atrapa-nos e cativa-nos ela no seu comentário. Vontades enormes de ler Halas, por exemplo. Quando isso não acontece, aparecem a bricandeira e o humor. Porvezes propõe pequenas mudanças para perfeccionar uma obra, como no caso do Breve atlas das borboletas, que depois de lido, e vistos os temas que focaliza o autor, sugere titular: Como cazar borboletas, para que estas espécies que não estão em perigo de extinção, o estém quanto antes melhor. Noutras muitas ocasiões, as minhas preferidas, utiliza as obras como pretexto para contar-nos ocorrências, anedotas e estórias da sua autoria. Imagina às leitoras seguindo ao pé da letra as propostas da obra recensionada. Ou desvela os seus truques de leitora para dar acabado o volume. Ou recria a vida prévia do livro: as decisões da tradutora, da editora, das correctoras, para fazer inevitável que isso saísse à luz. Faz literatura-ficção e imagina um mundo como esse que a obra propõe ou descreve. Pobre a escritora novel que leia este manual para escrever bem! Como fará para narrar a um tempo em primeira e terceira pessoa? Ai, que mundo esse no que as pedras tivessem propriedades curativas! Saber pola pulseira ou o colgante que essa mulher tem problemas gastrointestinais ou que aquela sofre o tormento dos pesadelos noturnos... Mas a realidade é que estas não são as técnicas que utiliza a autora para não desbotar leituras de livros, pois são as mesmas que utiliza com as leituras que a enlevam.

Todas as suas recensões parecem tecidas com os fios da tenrura e a retranca, assim combinados, o que dá uma grande suavidade ao resultado.

È fácil saber quando uma obra gostou ou não à autora. Se botas uma gargalhada ao ler a última frase do artigo, não perguntes polo livro em livrarias e bibliotecas. Se o que che nasce na boca é um leve e mimoso sorriso, corre, busca, pede, pirateia. Lê!

Wislawa Szymborka: Siempre lecturas no obligatorias.

Ediciones Alfabia. Barcelona 2014.

Comentarios

  1. em galego podemos ler a sua poesia nos Versos Escollidos da Edicións Positivas.

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  2. Que gozada de texto! Dan ganas de ler o libro!!!

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